Quanto custa Viajar? Para o país, não para o seu bolso

Quanto custa viajar? Uma pergunta bem comum entre viajantes, principalmente de primeira viagem. Bem, quem viaja quer uma coisa: Viajar muito, gastando pouco. Hostels estão se tornando hotéis de 3-estrelas, jovens turistas estão cada vez ficando mais exigentes, querendo padrões altos por cada vez menos. Não serei hipócrita, pois também quero. Pelo menos já quis um dia.

Todos querem o prazer de viajar muito, gastando o mínimo possível. Quem não quer isso? Já estou viajando pelo mundo, por longos e curtos períodos, há quase 20 anos. Não, não sou tão velho assim não, apenas comecei cedo. Mas esse post que pode parecer uma lição de moral é apenas para ilustrar realmente quanto custa viajar. Já escrevemos o suficiente sobre o quanto viajar custa para você, mas e os custos para o seu destino?

Quero abrir esse debate e, através de seus comentários, quero sempre melhorar esse post com mais e mais informações.

Quanto Custa Viajar: Motivação para esse post

Já faz quase dois anos que mudei para o Butão. Todo mundo que tenta vir para o Butão, desiste logo no começo. Para quem não sabe, para viajar para o Butão, é obrigatório pagar uma taxa de US$200/US$250 por dia.

O governo do Butão observou a destruição causada no Nepal e na Índia devido ao turismo descontrolado. Sendo assim, introduziu um imposto diário para poder custear a manutenção de florestas e o impacto negativo gerado por turistas.

Comecei a me perguntar e tentar ver o porquê dessa cobrança, e um mundo de questões mais fundas começou a surgir.

Tentarei qualificar (quantificar é quase impossível) o quanto custa viajar para seu país de destino, não para o seu bolso. Isso serve para mochileiros ou viajantes de luxo (e todos entre), pois os custos são relativamente parecidos, acreditem ou não.

Quanto Custa Viajar: Lixo

Estamos numa era da vida onde lixo é um grande problema. Neste aspecto, vou generalizar e pegar todo tipo de lixo: orgânico, recicláveis e não recicláveis. Minha razão por fazer isso é que, em média, apenas 9% do lixo do mundo é reciclado, segundo a Organização das Nações Unidas (em inglês).

Um típico turista gera, em média, 1kg de lixo por dia durante a sua viagem. Outros estudos mencionam que a quantidade de lixo de uma cidade turística pode chegar a 14% do total de lixo. Num país, extremamente turístico, como a França, isso refere a quase 4000kg de lixo gerado a cada segundo. Bali também é um destino que está debaixo de uma montanha de lixo (foto abaixo).

Já vejo alguém mencionando nos comentários: “Mas estes países recebem impostos para lidarem com seus lixos”. Sim, em boa parte dos países, isso pode ser verdade. Mas devido a custos de governo, municípios necessitam de subsídios federais para manter o gerenciamento do lixo sob controle. Com crises, cortes de custos, deslocamento de fundos e etc., saneamento básico se torna um problema só com a população local. Adicionando o stress que turismo pode colocar sobre isso, muito lugares não conseguem ter uma coleta de lixo eficiente.

Em muitos países do Sudeste Asiático, devido à corrupção, falta de organização, entre outros, o saneamento básico e coleta de lixo não são prioridades. Então se torna parte da cultura jogar lixo em qualquer lugar. Na Indonésia, é comum ver restaurantes de beira de praia jogando seus lixos diretamente no mar. Um pouco mais de 80% de todo lixo no mar é gerado em regiões litorâneas. Esses são locais movidos à turismo.

No geral, é muito provável que o lixo que você gera durante as suas férias acabará no mar, lagos e rios próximos ao seu lugar destino, infelizmente.

Quanto Custa Viajar: Impacto Ambiental

Um dos maiores impactos de turismo num país é o impacto ambiental. Muitos lugares manipulados para dar uma beleza estética, na verdade, estão no limite de suas existências. O meio ambiente e seu ecosistema são constantemente destruídos, acabando tendo que ser fechados para permitir sua recomposição. Um dos exemplos mais recentes é o de Maya Bay, na Tailândia. Um lugar aparentemente pristino, com águas limpidas e tudo mais, estava completamente destruído, sem vida. O governo da Tailândia decidiu fechar a Baía pelo menos até 2021. Sinais positivos já tem sido mostrado, como o retorno dos tubarões para a Baía.

Uso de Terra

Turismo existe de todas as maneiras que você pode imaginar. Acho que todos assistiram ao filme Os Descendentes. Caso não tenha, o filme é sobre uma família descendente da Realeza Havaiana que herdou uma praia linda. Enquanto o resto da família queria vendê-la para um grande hotel, o que ficou encubido em tomar a decisão da venda estava tentando achar uma alternativa para mantê-la.

Enfim, chega de falar desse filme! O que eu estou querendo dizer é que a construção de hotéis, campos de golf, áreas de lazer, baladas de praia, áreas de mergulho, pousadas a beira da praia, etc. coloca um baita stress sob o ecossistema local. Árvores tem que ser derrubadas, gerando erosão, deslocamento de espécies (que provavelmente você está pagando para ir ver), o uso de água aumenta exponencialmente (todo mundo hoje em dia quer banho quente até no meio do deserto do Saara). Com a falta de água no mundo, satisfazer as demasiadas vontades de turistas tira água preciosa do povo local.

Para ter uma vista linda para o mar verde, muitos hotéis acabam sendo construídos nas faces de montanhas. Árvores que, préviamente, sugavam a água de chuva e cujas raízes também davam suporte à terra, são removidas para a construção. Existem vários casos de acidentes horríveis, como em Yorkshire, na Inglaterra, onde um hotel 4-estrelas foi levado por um deslizamento de terra, custando a vida de muitas pessoas e milhões de dinheiros locais para o governo.

Uso de Água

Meu, por que têm campos de Golf em Dubai? Na Arábia Saudita? Em Thimphu, no Butão? Porque Las Vegas existe? Todos são lugares que, para manter sua infraestrutura e consumo turístico excessivo, precisam fazer algumas coisas absurdas.

Em Thimphu, por exemplo, existe um problema enorme com falta de água. Em certas épocas do ano, grande parte das casas só tem água por uma hora por dia. Mas o campo de golf está sempre verdinho. Como pode isso? Campos de golf são frequentados por turistas, com muito poucos locais praticando o esporte. Geralmente, são poucas pessoas ricas com aquele monte de terra só para eles.

Jogar golf em grama seca não rola. Ninguém quer jogar golf depois de uma garoinha leve e ter que sujar suas luvas brancas no barro. Para que isso não aconteça, milhares de litros de água tem que ser usados para irrigação de campos.

Eu disse milhares? Na verdade, são por volta de 3 MILHÕES de litros de água por semana para irrigar um campo de golf. Campo de golf é apenas um exemplo óbvio de desvio de recursos naturais, muitos em vários lugares onde esses recursos são escassos. Piscinas, restaurantes, hotéis também estão entre os maior consumidores de água.

É muito provável que você passará mal na Índia. Tudo devido à água. Mas não importa o hostel onde você ficar, terá água limpa e abundante para tomar banho e dar descargas à vontade. Mas, para metade da população da Índia, defecar à céu aberto ainda é um hábito comum e necessário por falta de alternativa.

Impactos sobre a Fauna Local

Bem, já falamos sobre hotéis, resorts, campos de golf e até cidades que são construídas no meio do nada, tudo em nome do turismo descontrolado. Como podem ver, é difícil dar exemplos isolados sobre diferentes áreas do turismo. Para que tudo isso fosse construído, dezenas de milhares de kilômetros quadrados são destruídas e migração em massa de espécies acontecem.

Lembro quando fui para Koh Phi Phi em 2009. Era bastante comum andar nas praias locais e ver peixes palhaços próximos à beira da praia. Bastava colocar a cabeça debaixo d’água com um óculos e se maravilhar. Voltei lá em 2019. A mesma praia onde fiquei quase louco estava frequentemente inapropriada para banho. Os peixes, anêmonas, corais, etc. não existiam mais naquela praia.

Turismo com elefantes ainda é bastante comum pelo sudeste asiático. Felizmente, estamos vendo uma guinada positiva para acabar com o abuso de elefantes para turismo. Em Angkor, no Camboja, continua sendo bastante fácil alugar um elefante para passear pelos templos, como Angkor Thom. Dois anos atrás, um elefante morreu devido a exaustão e constantes maus tratos. Depois disso, uma petição foi feita para acabar com o abuso de 14 elefantes que ainda trabalham em Angkor. É um passo positivo!

Outros passos nesse sentido estão sendo feitos, como o fechamento de Maya Bay, como mencionei mais cedo.

Mudança Climática

Para adicionar ao abuso de seres vivos, um dos maiores vilões é mudança climática. Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, turismo contribui 5% em emissões de gases do efeito estufa. Desses 5%, 3/4 vem de transportes. Turismo continua crescendo muito, devido o crescimento e influência da China e Índia, os países mais populosos dos mundo. Empresas aéreas continuam crescendo, com as “budgets airlines” a frente desse crescimento.

Essa mudança climática contribui para todos os outros aspectos mencionados aqui. Stress no consumo de água, terra para agricultura, mortes de corais etc, com turismo sendo um contribuinte considerável.

Êxodo Rural

Em muitos países, centros urbanos são os destinos mais visitados por turistas. Isso acaba causando um êxodo rural por pessoas procurando uma vida melhor. Um exemplo disso é o Camboja. Camboja sofreu muito nas mãos do Khmer Rouge, “tentando” transformar o país em uma “Utopia Rural”. A história, talvez muitos de nós sabemos. Mas com o fim do Khmer Rouge e uma boa parte da população do país deixada na pobreza, turismo foi uma saída para muitas pessoas.

Com a abertura do turismo descontrolado no país, muitas famílias se mudaram para centros urbanos, como Phnon Penh e Siem Riep. Para a família conseguir se manter, colocam inclusive crianças para trabalhar.

Volunturismo

Um dos grandes problemas desses países mais pobres são os “volunturismo”. Com muita frequência, jovens vão fazer trabalho voluntário em países pobres.

Muitos acabam indo para orfanatos. Infelizmente, muito desses orfanatos são compostos por crianças alugadas ou até vendidas pelos pais para se sustentarem e, assim, sustentando esse tipo horrível de turismo. Jovens com boa vontade acabam gastando seu dinheiro (volunturismo não é gratuito), assim sustentando essa prática.

Turismo Invasivo – “Feel Good Tours”

Mencionarei brevemente o tipo de turismo, como favela-tour, turismo onde turistas vão para dentro das casas de pessoas pobres para, no final, se sentirem bem pelas vidas que tem. Chamo isso de “feel-good tour”. Favelas no Brasil, Colônias Populares no México, Chawls na Índia, com o povo sendo visto como algo em museu (para não dizer zoológico). O site tourism concern entrevistou 25 moradores da Comunidade da Rocinha, com todos dizendo que não vêem benefícios nesse tipo de turismo.

Segundo o Presidente da Comunidade da Rocinha, o turismo que acontece na comunidade é exploratório. “Turismo na Rocinha é bom para quem o vende.”

Quanto Custa Viajar: Possíveis Soluções

Só um disclaimer aqui. Turismo é muito bom! Todos nós gostamos muito de viajar mas, infelizmente, a maneira como a grande maioria viaja não é algo sustentável.

Introducão de Impostos

Muitos países estão tomando medidas para tentar controlar o número de turista e meios de mitigar os impactos negativos causados por turismo.

O mais impopular, como acontece no Butão, é a cobrança de imposto diário para visita. Impopular, mas muito eficiente. Veneza começou a cobrar €10 para turistas que fazem bate-e-volta para a cidade. Outro imposto já é cobrado para visitantes à ilha, mas isso só tende a aumentar. Quem visita Veneza sabe como é. Aquele monte de gôndolas batendo umas nas outras, batendo nos muros das casas, muitas casas caindo aos pedaços, turistas alimentando pombos para fotos etc. Veneza é um lugar onde turismo tem tido um impacto muito negativo. Por esses motivos, decidiram introduzir esses impostos.

Vários outros países europeus já estão cobrando para visitas de turistas em suas cidades. No site Love Money, existe uma lista de como, onde e quanto é cobrado em diversos países da europa. Outros países, como Japão, também introduziram uma taxa para turistas.

Ecoturismo

Ecoturismo e turismo sustentável tem sido uma área de crescimento muito forte. Ecoturismo tem sido responsável pelo crescimento de áreas naturais protegidas. Isso está forçando governos a investirem em proteção de habitats, manutenção do ambiente local e, em muitos lugares, o crescimento de áreas protegidas já existentes.

Ecoturismo continua sendo uma opção cara, mas com o crescimento de competição, os valores tenderão a cair.

Felizmente, turistas estão se tornando mais conscientes, sempre procurando destinos mais verdes, ou hotéis mais transparentes sobre seu gerenciamento de lixo, reciclagem etc.

Existem lugares que estão tentando diminuir seu impacto ambiental devido ao turismo em excesso. É o caso da trilha do Monte Rinjani.

O Que Turistas Podem Fazer para Diminuir o Custo do Turismo para o País?

Essa parte não terá referências, mas são coisas que, na minha opinião, podem ajudar a aliviar o seu impacto quando viajar e ser mais consciente do quanto custa viajar.

Viajar custa muito caro para o seu destino. Chega a ser até difícil quantificar os custos reais para manutenção de um ambiente por turista. Estudos tem observado impactos negativos, mas existem coisas que você e eu podemos fazer para diminuir o seu impacto sobre o meio ambiente e seu ecosistema:

Coisas que podemos fazer para sermos turistas mais sustentáveis

• Procurar acomodações que mostram transparência e preocupação com o meio ambiente. Por exemplo: Reciclam? Usam água de reuso? Usam painéis solares? Existem estações para encher garrafinhas de água?
• Levar suas próprias garrafas de alumínio;
• Não comprar água em garrafas plásticas. Como disse acima, encher nossas próprias garrafas de água;
• Comprar canudos de metal ou bambu e fazer deles ítens essenciais de viagem;
• Recusar canudos ou copos plásticos. Forçar os lugares a mudar a atitude;
• Sempre carregar uma sacolinha de pano ou mochila para as compras. Evitar sacolas plásticas;
• Também carregar uma sacolinha e, caso ver algo no chão, ser um exemplo para os outros! Já testei isso e funciona! O povo local odeia que um turista tente limpar a cidade deles, sentem um pouco de vergonha e, geralmente, fazem o mesmo.
• Contratar um guia local! Viajar por conta é super legal, mas investir no conhecimento local ajuda o turista e a comunidade;
• Evitar turismo que abusam de animais ou pessoas. Se o santuário faz passeios montado em elefante, melhor não visitar! Pesquisar esse tipo de informação é essencial;
• Se uma agência oferece um tour de regiões menos favorecidas, talvez o melhor seja recusar! Isso não quer dizer não fazer esses tours, mas existem meios de você ser convidado pelos locais para visitá-los, tem como ficarem em hostels e hotéis localizados dentro da comunidade. Isso te dará uma experiência muito mais real do que é viver lá.

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Publicado por Wagner Nogueira

Wagner estudou Física Teórica (Bacharel) e Climatologia (Mestrado) na University College Dublin, na Irlanda. Tem Doutorado em Meteorologia pela Universidade de Reading e Pós-Graduação em Educação pela Universidade de Oxford. Hoje é professor de Física e Matemática no Reino do Butão. Tem paixão por história, desenho animado e jardinagem. Já visitou 52 países.